A recente decisão do STJ sobre o contrato-promessa de compra e venda de habitação
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Artigo setembro 2024
Imobiliário, Turismo e Construção
No passado dia 2 de julho de 2024, acordaram os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça, no processo 3587/21.0T8LOU.P1.S1 que, se as partes celebrarem um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel de habitação a ser construído pelos vendedores sem qualquer previsão de prazo para celebração da escritura definitiva, desde que reunidas as condições para a sua celebração, qualquer uma das partes pode exigir o cumprimento da obrigação.
Antes da análise concreta desta decisão, importa fazer uma breve referência a algumas das características do contrato de promessa que se encontra regulado nos artigos 410º e seguintes do Código Civill (em diante designado como CC). O nº1 do artigo 410º do CC define como contrato-promessa a “convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato”. Deste contrato-promessa nasce uma obrigação de prestação de um facto, ou seja, há a emissão de uma declaração negocial, de vontade de realizar um outro negócio futuramente, o chamado negócio prometido. No caso em concreto, estando em causa um contrato-promessa de compra e venda, uma das partes promete vender (promitente-vendedor) e outra promete comprar (promitente-comprador), assumindo ambas a obrigação de, no futuro, celebrarem o contrato prometido, o contrato de compra e venda. A regra do contrato-promessa é da liberdade de forma (artigo 219º do CC), contudo, sempre que a lei exija documento autêntico ou particular para o contrato prometido, a promessa só vale se constar de documento assinado pela parte(s) que se vincula(m), assim prevê o nº2 do artigo 410º do CC. Acrescenta o nº3 do mesmo artigo que o documento referido no nº2 deve conter o reconhecimento presencial das assinaturas do promitente e a certificação pela entidade que realiza esse reconhecimento da existência da respetiva licença de utilização ou de construção sempre que “a promessa em causa, for respeitante à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre o edifício, ou fração autónoma dele, já construído, em construção ou a construir”. Aqui chegados, é de facto relevante analisar a decisão tomada pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Em primeiro lugar, cumpre referir que foi, em 1ª instância, intentada uma ação declarativa de processo comum, em que a autora alegou que tinha celebrado um contrato-promessa com os réus em que estes prometeram vender e esta prometeu comprar-lhes um prédio urbano. Acontece que, alegadamente, os réus deveriam construir a aludida habitação e entregá-la no prazo de um ano a contar do respetivo licenciamento, e entregar à autora a documentação necessária para que esta marcasse a escritura definitiva. Sucede que a autora, não teria, alegadamente, marcado esta escritura dentro do prazo acordado, e, portanto, os réus informaram-na que tinham declarado o contrato-promessa resolvido, por incumprimento definitivo da autora. Após este acontecimento, a autora marcou data para a realização da escritura, contudo os réus não compareceram. Esta comunicou-lhes, então, a resolução do contrato-promessa por incumprimento definitivo dos réus. Assim, pediu a autora ao Tribunal que fosse reconhecida a resolução do contrato-promessa de compra e venda, por incumprimento definitivo exclusivamente imputável aos réus e que estes fossem condenados a restituir o dobro do sinal que esta havia prestado, nos termos do artigo 442 nº2 do CC. Vieram os réus contestar, alegando desde logo que a declaração de resolução do contrato-promessa por parte da autora seria ineficaz por ter ocorrido após a resolução do contrato por eles operada. Para além disso, alegaram que tinham cumprido tudo a que estavam obrigados. Foi então, após audiência de discussão e julgamento, proferida sentença que julgou a ação procedente e condenou os réus. Contudo, inconformados com a decisão, os réus recorrem à Relação do Porto, apelando da sentença. Na verdade, julgaram estes juízes procedente o recurso, revogando a sentença proferida em primeira instância. Vem, por fim, a autora interpor revista ao Supremo Tribunal de Justiça. Ora, entenderam estes juízes que, de facto, foi celebrado entre as partes um contrato-promessa de um bem imóvel ainda por construir, nos termos do artigo 410º nº1 do CC. Neste contrato, os réus obrigavam-se a entregar o imóvel pronto a habitar no prazo de 1 ano a contar da data do licenciamento camarário e assim que reunissem toda a documentação necessária, entregariam à autora para que esta procedesse à marcação da escritura pública definitiva do contrato, devendo informar os réus desta data e do local da sua realização com antecedência mínima de 5 dias, o que autora não fez. Ora, neste sentido entendeu o Tribunal que, após a conclusão da construção, não havendo qualquer prazo para a celebração da escritura, e estando reunidas todas as condições para a realização da escritura pública (que foi o caso), pode qualquer uma das partes exigir à outra o cumprimento da obrigação, desde que feita respetiva interpelação (em respeito pelos artigos 777 nº1 e 805º nº1 do CC). Isto significa desde logo que, num contrato-promessa de compra e venda de um bem imóvel para habitação a ser construído, quando não tenha sido determinado pelas partes a data para a celebração da escritura, a partir do momento em que todos os requisitos estejam cumpridos, ou seja, obra concluída, e toda a documentação dentro dos conformes legais, é possível que uma das partes exija o cumprimento da obrigação decorrente do contrato celebrado. De facto, decisões dos tribunais, como esta, desempenham um papel crucial na determinação da atuação das partes envolvidas, garantindo um correta interpretação e aplicação da lei em matérias tão relevantes e frequentes como a celebração de contratos-promessa de compra e venda. Desta forma, esta sentença revela-se fundamental para a resolução e análise de futuros litígios nesta matéria, ao estabelecer um precedente jurídico da garantia, claro e orientador. + Artigos
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